28.3.09




Apaixonar-se é uma espécie de parto ao contrário no qual temos que fazer passar o corpo e alma do outro pelas nesgas que medeiam as costelas e simultaneamente comprimi-lo até caber por inteiro no lugar do coração. Contracções e dilatações são neste caso substituídas por ansiedade e palpitações cuja frequência é extremamente difícil de detectar mais parecendo uma permanência.


(passageiropédia 2009)


imagem: "Psyche et L'Amour" (1889) de William-Adolphe Bouguereau

27.3.09


Eternidade

Quero estar aqui,
Neste lugar,
Agora,
Com os meus fantasmas,
Com os meus desastres,
Com a minha história.

Quero dar-te a ti
O meu lugar cativo,
A minha hora,
Para os teus dilemas,
Para os teus poemas,
Para a tua glória,

Quero ser metade,
Numa meia cama,
Basta meia hora…
………………….
Fantasmas, desastres e história,
Dilemas, poemas e glória,
Tudo o que existe numa só memória.

25.3.09




TRANSPARÊNCIA



Transporta, importa, submete, comporta, inscreve tal qual
tudo bebe na sua transparência...

Que importa, sorri, subscreve, está ali, suporta, sustém,
não é de ninguém.

É de todos, é de tudo, é comum,
é surdo-mudo, é constante e mutante, é afável, é Amor,

É dor, é sofrimento, é calor, contentamento, Paz, é interior,
transparente,
de verdade é aquilo que fôr.



Consuelo



Este comentário/poema foi-me enviado para a mensagem do dia 20.03.2009. Tal como prometido no momento deixo aqui a ilustração do mesmo.

24.3.09



Obsessivamente prognosticados

Vivemos tempos de um mundo exageradamente antecipativo. Não nos basta conhecer os ciclos, da água, das estacões do ano, da gestação, etc. Queremos prever tudo, antecipar cenários, desvendar todos os futuros.
Acabou a história da surpresa do nascimento.
Acabou o prazer de um bom jogo de futebol.
Antecipamos repetidamente, com base em inquéritos e estatísticas, todos os resultados e depois culpamos alguém ou algo de não ter assim sucedido. Tomamos os momentos reais como algo aberrante que não devia ter sucedido ao ponto de quase o ignorarmos e passamos semanas a divagar sobre o que estava previsto acrescentando dezenas de explicações e desculpas.
Não nos basta prever o tempo, queremos decidi-lo.
Não nos basta as agruras da vida, queremos prognosticar no futuro todas as variantes, fazendo da mais desgraçada conjuntura a mais provável fatal confirmação.
Queremos ver filmes que já sabemos como acabam ou cujo final é votado pela audiência. Mesmo assim deleitamo-nos, alimentando mais este nosso egocentrismo. Ou será egoísmo?
Desiludimo-nos com todas as ofertas que nos fazem pois só apreciamos as que pedimos.
Por fim trocamos a nossa vida pela dos outros, via cabo, para que o imponderável não seja para nós qualquer risco.
Não será por acaso que a astrologia está na moda, logo agora que a astronomia está cada vez mais exacta.
As religiões dão-nos um sentido para a morte e a leitura dos astros explica a vida num pacote dado em sortes. Bem sei que o materialismo é a coisa mais abstracta e imaginária que inventamos e que Deus é indefinível (graças a Deus). Mas este jogo que estamos a jogar é para ir a jogo, não para simular ou assistir.